Será que a profissão de ombudsman está com os dias contados? Afinal, com o público utilizando as redes sociais para reclamar da imprensa, qual será o papel do advogado do leitor?
Essas
questões vieram à tona e fomentam discussões sobre o futuro do ombudsman de
imprensa. Em 2012, a imprensa americana foi pega de surpresa, quando a
Publisher do Washington Post, Katharine Weymouth, anunciou o fim do cargo de
ombudsman, que perdurou por 43 anos. A função criada na imprensa pelo próprio
Post foi trocada por um “representante do leitor”, que apenas anota as
reclamações e as repassa a seus editores. A justificativa, segundo o editor Marty
Baron, foi que na era virtual, o jornal já possui uma rede de leitores e
críticos de mídias dispostos a apontar os erros do jornal, tornando o ombudsman
um cargo não necessário e muito custoso.
Para
esclarecer essas questões, o blog MídiaVisão conversou com um especialista na
área: o ex-ombudsman Mário Magalhães. O jornalista, que passou por jornais como
“Tribuna da Imprensa”, “O Globo”, “O Estado de S. Paulo”, foi ombudsman da
Folha de S. Paulo entre os anos de 2007 e 2008.
Mário Magalhães foi
ombudsman da Folha de 2007 a 2008. Foto: Ana Carolina Fernandes/Companhia das
Letras
Mídiavisão - Atualmente no Brasil, existem apenas dois
jornais que ainda contam com ombudsman. Panorama bem diferente dos EUA que
contam com profissionais em 20 jornais, segundo a ONO (OrganizationofNews
Ombudsmen). Porque o cargo ainda não decolou em terras brasileiras?
Mário Magalhães - Há vários motivos para a não
disseminação de ombudsmans no jornalismo brasileiro. É uma função cara, que
exige profissionais experimentados e estrutura que lhes dê respaldo. Quando eu
exerci a função na “Folha de S. Paulo”, de abril de 2007 a abril de 2008, o
atendimento médio era de cem leitores por dia.
Outro
motivo é que muitas Redações consideram mais efetivo manter equipes para
receber reclamações e demandas dos leitores sem a intermediação de um
ombudsman. Há quem julgue que hoje as redes sociais da internet são
instrumentos suficientes para a relação jornal-leitores.
Mas
o motivo principal para a existência de poucos ombudsmans, em minha opinião, é
a resistência atávica do jornalismo e dos jornalistas a serem criticados. Nós
adoramos criticar os outros e odiamos ser criticados.
A
maior novidade mundial dos últimos anos, no cenário dos ombudsmans do
jornalismo, é o extermínio da função nos Estados Unidos, onde dezenas de
publicações aboliram o cargo. O argumento mais recorrente é o da crise do
modelo de negócios que abate o jornalismo impresso norte-americano e sangra
suas finanças. A tendência internacional é cada vez haver menos ombudsmans.
Ombudsman jornalístico é uma espécie em extinção.
MídiaVisão - Em
uma sociedade em que os leitores e internautas podem reclamar do jornalismo das
mídias tradicionais nas redes sociais, qual papel o ombudsman pode exercer na
crítica de mídia?
Mário Magalhães - O ombudsman faz a crítica jornalística com base nos valores consagrados na publicação em que trabalha. No caso da “Folha”, o “Manual da Redação” é uma espécie de Constituição. Reiteradamente, eu reivindicava os preceitos do “Manual” ao analisar o noticiário.
Mário Magalhães - O ombudsman faz a crítica jornalística com base nos valores consagrados na publicação em que trabalha. No caso da “Folha”, o “Manual da Redação” é uma espécie de Constituição. Reiteradamente, eu reivindicava os preceitos do “Manual” ao analisar o noticiário.
A
crítica de mídia não é a única nem a principal missão do ombudsman. Eu
intermediava a relação dos leitores com a Redação. Se um leitor criticava
aspectos da cobertura, eu não sossegava até obter uma resposta dos jornalistas.
Ao procurar o ombudsman, os leitores sabem que terão um defensor a intermediar
suas demandas, mesmo que o ombudsman divirja delas.
Se
um leitor reclama pela internet, pode ou não receber uma satisfação dos
jornalistas. Se procurar o ombudsman, ele seguramente receberá, mesmo que não
se sinta satisfeito com o que ouvir.
MídiaVisão - Você acha que o jornalismo desintermediado
produzido em blogs de notícia e redes sociais pode ameaçar a imprensa
tradicional? Como você avalia a qualidade do jornalismo produzido na plataforma
digital?
Mário
Magalhães - Hoje eu escrevo para a mídia impressa e, sobretudo, para a
digital, na qual mantenho um blog no UOL. Há jornalismo de qualidade e de má
qualidade em todas as plataformas de comunicação.
MídiaVisão - É certo dizer que o ombudsman cumpre o papel
de educador para as mídias?
Mário
Magalhães - Um ombudsman pode e deve educar os jornalistas sobre os
desejos e apreensões dos leitores/espectadores/internautas/ouvintes, bem como
educar os leitores sobre como funciona o jornal. Na minha experiência de um
ano, sou obrigado a confessar, quem mais aprendeu fui eu com os leitores,
evidentemente.
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